Rubem Alves Um dos meus prazeres é passear pela feira. Vou para comprar. Olhos compradores são olhos caçadores: vão em busca de caça, coisas específicas para o almoço e a janta. Procuram. O que deve ser comprado está na listinha. Olhos caçadores não param sobre o que não está escrito nela. Mas não vou só para comprar. Alterno o olhar caçador com o olhar vagabundo. O olhar vagabundo não procura nada. Ele vai passeando sobre as coisas. O olhar vagabundo tem prazer nas coisas que não vão ser compradas e não vão ser comidas. O olhar caçador está a serviço da boca. Olham para a boca comer. Mas o olhar vagabundo, é ele que come. A gente fala: comer com os olhos. É verdade. Os olhos vagabundos são aqueles que comem o que vêem. E sentem prazer. A Adélia diz que Deus a castiga de vez em quando, tirando-lhe a poesia. Ela explica dizendo que fica sem poesia quando seus olhos, olhando para uma pedra, vêem uma pedra. Na feira é possível ir com olhos poéticos e com olhos não poéticos. Os olhos não
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